O último suspiro de Haruki dissipou-se no ar como uma brisa morna que abandona o corpo.
Por um instante, ninguém se moveu. Nem um som. Nem um passo. O mundo ficou suspenso no tempo.
Mei apertou o corpo do marido contra o peito, os lábios trémulos colando-se à sua testa fria. Não havia mais lágrimas, apenas um vazio seco e doído que lhe pesava na alma como mil pedras.
— Haruki... — murmurou ela, a voz quebrada. — Fica... só mais um segundo...
Hideo levantou-se com dificuldade. As pernas vacilavam, o olhar perdido. Observava o corpo inerte do pai com olhos vazios, sem saber se ainda era o mesmo homem que se ajoelhara ali momentos antes.
— Lamento por isso Hideo. — Diz Ricardo puxando para seus braços. Ele havia ouvido tudo e não queria interferir naquele momento, mas sabia que Hideo precisava do apoio da sua família.
— Ele... Se foi. — Diz ele em um fio de voz, se permitindo quebrar nos braços de Ricardo.
À volta deles, os soldados da Fênix abaixaram as armas. Alguns ainda vigiavam o perímetro, mas agora era claro: o perigo imediato havia passado. O atirador escapara, mas deixara uma ferida mais profunda que qualquer outra.
Sayuri correu em direção ao grupo, o rosto alarmado. Parou ao ver o corpo, os olhos arregalados encontrando os de Hideo. O coração dela afundou. Lentamente, aproximou-se, ajoelhando-se ao lado do noivo. Colocou a mão sobre o ombro dele, mas ele não reagiu. Ela estava em casa quando tinha sido informada por Ricardo sobre o que tinha acontecido.
— Hideo… — sussurrou. Ela segura seu rosto entre as mãos o virando para ela, o seu coração se quebra ao ver a expressão desolada dele.
— Ele... ele se foi, Sayuri. — Diz em um tom de voz baixo. Ela apenas o puxa para si o confortando o melhor que podia naquele momento.
— Eu vou cuidar de você, não se preocupe Hideo. — Diz enquanto alisava os seus cabelos.
Ele permaneceu em silêncio. Não havia palavras. Apenas o som abafado de uma dor que crescia dentro dele como um grito silencioso. Algo que ele jamais pensou que sentiria se seu pai pertisse, mas ao que parecia ele estava apenas se enganando durante todod aquele tempo.
O corpo de Haruki foi envolto com uma bandeira ancestral da família, uma honra reservada apenas aos chefes da linhagem. Mas, pela primeira vez, tal cerimónia não parecia grandiosa. Parecia injusta. Shiro com a ajuda de outros soldados o levaram para a mansão após o médico atestar o óbito do líder da Yakuza. Ele tinha sido alveja por um tiro nas costas que tinha lhe atingido alguns órgãos internos acelerando a sua morte.
Mei permanecia sentada no chão, recusando-se a afastar-se do marido. As mãos sujas de sangue, os olhos vidrados. Ninguém ousava tocá-la. Era um luto sagrado. Ela não tinha perdido apenas o marido, mas o amor da sua vida e para ela não importava o que Haruki havia feito em vida, ele havia cuidado dela e era isso que lhe importava naquele momento.
Hideo olhava para o horizonte. Ele recordava as palavras do pai — as primeiras de afeto verdadeiro, as últimas de arrependimento. E não sabia o que fazer com elas. Não sabia como aplacaria aquela dor que ameaçava tomar o seu corpo e mente.
Parte de si queria manter o ódio vivo, como uma armadura. Mas outra parte… aquela que escutara “tenho orgulho de você”… essa parte queria fazer diferente.
Hideo caminhou até à mãe. Ajoelhou-se e, envolveu-a nos seus braços. Mei desabou contra o peito do filho. As lágrimas voltando a rolar por seu rosto de forma descontrolada.
— Ele te amava tanto… — disse ela entre soluços. — Só não sabia mostrar…
Hideo fechou os olhos e sentiu as lágrimas rolarem. Abraçou a mãe com força. E naquele abraço, silenciosamente, prometeu: o ciclo terminava ali. Com Haruki.
— Eu vou cuidar da senhora mãe. — Diz ele dando um beijo na testa dela enquanto a embalava nos seus braços.
Hideo não sabia quanto tempo havia passado desde que tinha se sentado no chão para confortar a sua mãe. Ele simplesmente deixou que ela colocasse para fora toda a dor que estava sentindo naquele momento. Quando ela já estava mais calma ele se levantou com ela nos seus braços e seguiu para a mansão com os outros atrás de si.
Hideo sobe as escadas e leva a sua mãe para o seu quarto, não queria que ela ficasse no dela onde tantas lembranças poderiam invadir a sua mente. Ele a coloca com cuidado sobre a cama e segundos depois o médico entra e lhe entrega um copo, ele apenas pega dá a ela para beber. Alguns minutos depois Mei cai em sono profundo. Hideo a cobre e deixa o quarto em silêncio.
A pessoa que deixa o quarto não era mais Hideo, era o novo líder da Yakuza, aquele que pretendia vingar a morte de seu pai mesmo que ele não merecesse, aquele que queimaria aquela cidade se não obtivesse respostas.
Quando Hideo chega a sala ele encontra o olhar de todos sobre ele.
— Não conseguimos encontrar o responsável senhor. — Diz Shiro se aproximando de cabeça baixa.
— Envie o pessoal treinado para isso, quero respostas até o final do dia Shiro. — Diz ele com a voz dura como aço.
— Será feito senhor. — Diz ele se retirando rapidamente.
— Nosso pessoal está vindo, pedi alguns soldados extras para cuidar da proteção de vocês. — Diz Ricardo a Hideo. — Vito também esta vindo, e não está nada feliz.
— Obrigado pela ajuda Ricardo. — Diz Hideo.
— Você faz parte da nossa família e terá tudo o que qualquer um de nós tem. — Responde ele.
— Venha. — Diz Sayuri o pegando pela mão e o sentando no sofá. — Preciso trocar esses curativos.
— Não eu... — Ela o interrompe com olhos sombrios.
— Meu pessoal está na rua, os de Ricardo e Matteo também, não a nada que você possa fazer agora, então sente essa sua b***a no sofá e fique quieto enquanto eu troco o seu curativo!
Um sorriso triste curva os lábios de Hideo ao ouvir as palavras de Sayuri, e ao lembrar das palavras do pai ele suspira conformado. Faria tudo diferente, a começar pela forma que tratava Sayuri.