A situação de Tamandaré estava mais feia do que aparentava.
A cidade era simplesmente um caos: veículos capotados, batidos, abandonados, imundos e destruídos espalhados pelas principais ruas.
Por a infecção ter se espalhado a todo vapor em meados de dezembro, a maioria das pessoas de cidades vizinhas iam para o litoral curtir a praia e o sol, principalmente naquela cidade, porém aquela foi uma péssima ideia, só servindo para aglomerar ainda mais a quantidade de infectados em um pequeno espaço.
Tamandaré tinha evoluído bastante por causa do comércio nas altas temporadas, em que turistas vinham passar alguns meses curtindo. Nunca fizeram prédios maiores do que três andares por lá, pois tinha uma lei municipal que proibia para manter o visual de “cidade litorânea”.
Por causa dessa lei e também de outros fatores, a cidade começou a expandir desordenadamente, com muitas dessas casas ficando vazias pela maior parte do ano (pois somente de novembro a fevereiro e em alguns feriados que a cidade enchia pra valer).
E por tudo ter acontecido em dezembro, mês que Tamandaré estava entupida de gente, a cidade se tornou um caos.
A maioria dos muros de casas de praia eram baixos e inseguros. Uma casa ou outra tinha muro alto, e logo que a infecção começou a se espalhar, foi quando as pessoas demonstraram o que eram capazes de fazer.
Muitos fizeram barricadas em casa, jogando entulhos na entrada para dificultar a invasão de monstros, porém se esqueceram dos bandidos.
Uma imensa onda de arrastão foi realizada na cidade quase por inteira, com o aumento drástico da quantidade de estupros, latrocínios, roubos, esfaqueamentos etc.
A polícia de Tamandaré não conseguiu dar conta de tudo, pois a maioria dos roubos e confusões eram realizados pelas pessoas comuns, que nunca antes tinham cometido coisas assim na vida.
O desespero e o pânico cresceram imediatamente e muitas mortes foram registradas nos primeiros dias de surto.
Diversas barricadas caseiras foram quebradas e com isso o número de infectados foi aumentando cada vez mais até sair do controle em um curto prazo.
O chefe do departamento de polícia de Tamandaré pediu ajuda ao estado, que mandou comboios do batalhão de choque e também caravanas militares em uma parceria com o governo federal, no intuito de combater os infectados e pegar os responsáveis dos latrocínios, roubos, estupros etc.
Essa medida foi tomada tardiamente e, como sempre ocorre no Brasil, as coisas saíram do controle e deram errado.
O governador do estado de Pernambuco não soube o que fazer por causa do momento conturbado em que estava passando, e, por isso, ele próprio decidiu mandar os poucos e limitados comboios e caravanas que tinham disponíveis para as cidades com maior número de habitantes (Recife, Caruaru, Petrolina, Garanhuns etc), desistindo de defender as cidades menores.
Essa medida parecia ser efetiva na teoria, porém em menos de uma semana, todas as cidades foram perdidas, e Pernambuco inteiro foi tomado pela Lyssadyceps, sobrando somente poucas pessoas e alguns grupos civis organizados.
A grande maioria dos policiais e dos militares morreram em combate contra os infectados, deixando veículos, equipamentos militares, armas, granadas, facas e tudo mais abandonados no meio de sangrentas zonas de guerra, principalmente nas cidades maiores.
Tamandaré foi uma das cidades em que um imenso comboio do batalhão de choque chegou para conter a onda de assaltos e estupros, além de tentar combater os infectados.
Porém, pelo visto, deu errado como todos os outros, e o fim que esse comboio teve ninguém sabe.
O que importava era que agora Luiz Felipe tinha chegado na bela entrada da cidade, e iria procurar por vestígios do seu antigo grupo.
Seu coração apertava cada vez mais que ele dava um passo.
No fundo ele sentia que tudo daria certo, e que veria novamente rostos familiares.
Porém Tamandaré era grande, ele teria que procurar bastante e contar com um pouco de sorte para poder encontrar seus amigos.
E a todo o momento o rapaz tentava afastar pensamentos ruins, o que era difícil, pois o que eles passaram juntos foi drástico.
Mas a vida era assim mesmo.
O segredo é continuar e não olhar para trás.
Desistir não é uma opção.
...
A chuva começara a cair levemente.
Luiz ainda mancava e sentia dores no tornozelo torcido, mesmo após ter tomado anti-inflamatórios e passado uma pomada (de validade duvidosa) no local.
Ele precisava repousar antes que aquilo piorasse e demorasse ainda mais para sarar, porém a vontade de descobrir o que aconteceu com os remanescentes de seu antigo grupo era maior que tudo.
A entrada da cidade era muito bela, se não fosse pelo emaranhado de carros e corpos jogados pela rodovia que dava acesso ao interior.
Luiz evitava olhar ao redor e também tentava não pensar naquilo.
Todos aqueles corpos dilacerados e apodrecidos antes eram pessoas comuns, com família, amigos, trabalho e vários outros detalhes da vida.
O mais triste em tudo isso era saber que eles morreram em vão, pois é quase certo que o planeta Terra nunca mais vá se recuperar do forte golpe que sofreu.
Essa doença tinha vindo só para desgraçar com tudo.
Transformar um ser racional e com instinto criativo em um ser irracional e violento.
Qual o objetivo disso?
Por que Deus deixaria que isso acontecesse?
Disso Luiz nunca saberia, porém não importava mais.
A merda já tinha batido no ventilador, agora o que restava era tentar se reerguer.
“Pra onde eles poderiam ter ido? Alguma casa beira mar? Algum hotel abandonado? Algum supermercado?” pensou ele, tentando organizar suas ideias para começar a procurar pelos amigos.
Luiz respirou fundo e continuou caminhando lentamente por entre a rodovia que mais parecia um cemitério de carros e corpos abandonados.
O tempo tinha passado muito rápido, porém as mudanças acompanharam-no.
O asfalto quase não era mais visível de tanto lodo e musgo que tinha se criado. A pintura das casas e lojas não tinha mais cor viva, eram manchadas e bem apagadas, talvez por causa das fortes chuvas e da falta de manutenção. As calçadas tinham sido tomadas por lama, pedregulhos, entulhos, um corpo aqui e ali, lodo e musgos.
Por sorte Tamandaré não foi atingida pela grande enchente, e somente por isso a cidade não estava pior visualmente.
A única coisa que salvava todo aquele cenário caótico era um enorme letreiro com o nome “TAMANDARÉ” feito em concreto no meio de um redondel na rodovia (mas ainda assim as letras estavam com as cores apagadas e com lodo crescendo na base).
Já Luiz ignorava toda essa paisagem horrível.
Ele meio que tinha se acostumado com isso.
Se fosse antes talvez chegasse até mesmo a chorar vendo todas aquelas lojas saqueadas, corpos dilacerados e carros abandonados, porém agora ele não se importava mais.
Aquilo já fazia parte do seu dia a dia.
As cidades tinham se transformado em locais abandonados bem ao estilo “Chernobyl” e as pessoas vivas em monstros piores que os infectados.
Isso só provava que o ser humano era o ser vivo mais bem adaptável às situações.
Mesmo passando por tudo isso, alimentando-se mal, machucado, sem um lar e sem um veículo, Luiz continuava em frente, pois tinha um objetivo.
E só iria descansar quando conseguisse alcançá-lo.
...
Já era quase meio dia e o pobre rapaz continuava caminhando por entre as ruas da cidade litorânea.
Ele já tinha visitado aquele município algumas vezes, porém não se lembrava bem onde ficavam as coisas, e por isso perambulava de um lado para o outro, até que começou a escutar o barulho distante de uma aglomeração de infectados.
O mais estranho de tudo era que, além de não ser perto, ainda não era de noite.
Isso só significava uma coisa: alguém tinha os atiçado.
“O que houve agora?”
Luiz Felipe segurou firme o rifle que antes pertencia a Fred e apressou o passo o máximo que podia.
Ele estava no meio de um emaranhado de ruas apertadas com várias vielas sujas, sem asfalto e entulhos nos cantos.
Tudo o que podia fazer no momento era seguir o som, que a cada minuto aumentava, dando a entender que seria uma horda bastante perigosa.
Luiz passou por vários becos nojentos e sem calçamento, para depois alcançar uma das praças principais da cidade, a qual ele não lembrava o nome, porém antes era o ponto de encontro dos jovens.
Estava tendo uma intensa batalha ali.
No chão tinham vários corpos dilacerados (tanto envelhecidos quanto recentes) e dezenas de infectados corriam na direção do centro da imensa praça asfaltada e com jardins e flores pisoteadas.
Luiz Felipe não entendeu de primeira, porém com uma segunda olhada ele pôde perceber que lá no meio havia uma caravana militar, e que tinham alguns homens por lá, lutando contra os monstros desesperadamente.
A horda não era tão grande, e deveria ser composta por no máximo cinquenta a setenta doentes (ainda assim era um número absurdamente assustador).
O que mais chamou atenção não foi isso, e sim o fato de que homens com escudos do batalhão de choque lutavam incansavelmente.
A horda não parava de avançar, e a luta era travada violentamente, como se fosse um filme antigo de gladiadores.
Todos os homens vestiam roupas militares e batalhavam com os escudos resistentes e transparentes, além de um facão, machado ou foice.
Eles formavam uma linha de frente com os escudos a postos e esperavam os primeiros infectados chegarem, quando chegavam, empurravam-nos e golpeavam com força na cabeça, fazendo o sangue jorrar e os pedaços de carne serem arremessados no chão.
Só que o problema estava longe de acabar: cada vez mais monstros se aproximavam, cansando os combatentes e transformando a sangrenta batalha mais difícil do que o normal.
De onde Luiz estava dava para assistir tudo aquilo.
Ele não podia fazer muito para ajudar, porém tinha que tentar algo, em breve aqueles homens não suportariam mais e a linha de defesa seria rompida.
Ao olhar rapidamente nos arredores da batalha, Luiz percebeu vários corpos de militares dilacerados há um bom tempo e ainda com as armas por perto: poderia ser uma boa ideia pegar uma daquelas armas e descarregar nos infectados.
Ele atrairia atenção, porém não seria atacado por ser imune.
Quando o rapaz começou a andar na direção do local, outra coisa chamou sua atenção.
Mais precisamente um homem.
— NÃO DESISTAM, SEUS FILHOS DA PUTA! SUAS MULHERES E FILHOS ESTÃO NO ACAMPAMENTO! O QUE SERÁ DELES SE VOCÊS MORREREM? ENTÃO NÃO DESISTAM! MATEM ESSES DESGRAÇADOS! MATEM COMO SE NÃO HOUVESSE AMANHÃ! ATAQUEM! — gritou o provável líder dos combatentes.
Ele era um homem musculoso, porém de baixa estatura, tendo no máximo 1,70 m.
O líder dos homens com escudos era bastante ágil e tinha expressão imponente. Ele era o único sem camisa e de longe o melhor lutador, derrubando os infectados de dois em dois com golpes de escudo e de machado.
O cabelo do homem era de cor castanho claro e uma das coisas que mais chamava atenção nele era sua barba, da mesma cor do cabelo, mas bem volumosa.
— NÃO RECUEM! SE CADA UM MATAR DEZ NÓS VENCEMOS!
Até que Luiz decidiu ajudar, pois a situação deles não era muito favorável.
O líder dos combatentes estava em um frenesi tão forte que não conseguia pensar em mais nada a não ser matar.
Os infectados não paravam de chegar, e a cada instante, mais e mais deles furavam o bloqueio formado pelos escudos.
No total eram aproximadamente trinta homens, todos aparentemente bem treinados, portando escudos e machados, foices ou facões, além de vestirem roupas tipicamente militares, sem o capacete.
Só o líder que trajava uma calça verde-musgo e um par de botas pretas.
— ARTHUR! PRECISAMOS RECUAR! PERDEMOS TRÊS SOLDADOS E ELES NÃO PARAM DE CHEGAR! — falou um dos combatentes que estava na direita do líder, empurrando e derrubando os infectados que se chocavam no seu escudo.
— RECUAR? SE VOCÊ REPETIR ISSO DE NOVO EU VOU CRAVAR ESSE MACHADO NA SUA TESTA! AGUENTE FIRME! — ordenou Arthur, que era o líder deles.
Em poucos segundos de batalha a maré começou a virar: o que antes era uma horda composta por mais de cinquenta infectados, agora tinha se tornado em uma multidão de vinte ou trinta monstros espalhados pela praça, vindo na direção dos vários soldados.
— HOMENS! SEI QUE ESTÃO CANSADOS, MAS A VITÓRIA ESTÁ PERTO! NÃO DESISTAM! REDUZIMOS BASTANTE O NÚMERO DELES E TIVEMOS PERDAS MÍNIMAS! EM FORMAÇÃO!!! — gritou Arthur, enxugando o excesso de sangue do rosto e da barba com a mão que segurava o machado e se pondo no meio dos seus combatentes.
E a cena que Luiz Felipe viu foi incrível: a organização daqueles homens era absurda, e talvez isso fosse o fator mais importante que os estivesse levando a vitória no momento.
Os soldados rapidamente formaram duas “linhas de escudos”.
A primeira fileira era composta dos homens mais robustos, e eles encostavam seus escudos uns nos outros, lado a lado. Já a segunda e última fileira era formada por sete ou oito homens aparentemente mais fracos, que ficavam alguns passos atrás para proteger as costas dos combatentes da frente, caso algum infectado quebrasse a linha de defesa.
Mesmo depois de ter matado boa parte dos doentes, Arthur sabia que a batalha não estava vencida.
Mais infectados estavam chegando, enfurecidos.
— PREPAREM-SE! E HAJA O QUE HOUVER: NÃO QUEBREM A FORMAÇÃO! PERMANEÇAM NA ESTRATÉGIA! — ordenou o líder, batendo o machado no escudo com força para fazer barulho e sendo imitado pelos seus homens.
Luiz permaneceu boquiaberto e assistindo a cena.
Ele estava a mais ou menos cinquenta metros da zona de guerra, e bem ao lado esquerdo de tudo, de onde podia assistir sem ser incomodado.
No final, chegou a uma conclusão: se fosse ajudar, acabaria atrapalhando.
— SOLDADOS! ELES ESTÃO CHEGANDO! VAMOS DESTRUÍ-LOS! QUANDO VOLTARMOS IREMOS CONTAR AS NOSSAS MULHERES O QUE FIZEMOS! HOJE NÓS VAMOS ENTRAR PARA A HISTÓRIA! ATACAR!!!
“AAAAAHHH!”
Os combatentes começaram a gritar em uníssono e correr na direção da horda.
Quando chegaram perto o bastante, simplesmente fecharam a linha de defesa e seguraram firme os seus escudos.
Os infectados começaram a se chocar violentamente nos apetrechos de defesa do batalhão de choque, e a maioria dos monstros caiu no chão.
A tática estava funcionando perfeitamente.
— AGORA!
A cada doente que derrubava, Arthur golpeava com violência, cravando o machado na testa deles e retirando logo em seguida.
O segredo estava em suportar o impacto, pois os monstros vinham com tudo e batiam com todo o peso corporal no imenso escudo. Enquanto os homens permanecessem de pé e golpeando os infectados que caíam, estaria tudo bem. Porém no momento que alguém tropeçasse e soltasse o escudo, entraria em apuros.
— ARTHUR! OLHE! — falou um dos homens, apontando para frente enlouquecidamente enquanto se defendia do ataque de dois doentes.
Mas o líder sequer escutou o aviso.
— NÃO PAREM!
Houve um momento em que três infectados atacaram-no simultaneamente.
Arthur foi pego desprevenido e por pouco não foi mordido nas costas por um deles.
— FILHOS DA PUTA! — urrou o rapaz, desviando com destreza do ataque.
O líder rolou para o lado e, ainda agachado, pôs o escudo sob a cabeça, defendendo-se de diversos golpes ensandecidos de um dos três infectados que o atacava.
Ele segurou firme o machado e atingiu com tudo o joelho do monstro, derrubando e matando-o logo em seguida com um golpe fatal na cabeça.
Arthur se levantou o mais rápido que pôde e cravou o machado de bombeiro no meio do peitoral do segundo infectado, fazendo o sangue jorrar e respingar no seu rosto.
Já o terceiro e último maníaco que tentava atacá-lo partiu em disparada na sua direção e deu de cara com o escudo, caindo no chão e levando uma forte pisada na cabeça, tendo seus miolos explodido.
E foi aí que tudo aconteceu rápido demais.
No momento que Arthur terminou de matar os três monstros e foi respirar, um Touro o atacou.
— MAS QUE...
O infectado especial estava correndo na direção da multidão e, por azar, no meio do caminho estava o líder dos combatentes.
A pancada foi desferida com tanta força que o homem foi arremessado alguns metros para longe dali, caindo bem perto da horda, e se separando dos seus soldados.
— ARTHUUUUR!!! — gritou um dos homens, quebrando a linha de defesa e partindo em disparada atrás do seu líder.
A visão de Arthur ficou turva.
Ele estava completamente zonzo e mal sabia onde tinha ido parar.
O escudo dele estava jogado no chão ali por perto, e o machado também, porém o líder nada podia fazer, pois não estava em boas condições.
— Está na hora de agir… ou ele vai morrer! — falou Luiz Felipe para si mesmo, percebendo a seriedade da situação e se levantando do chão onde antes estava sentado.
Arthur cuspiu sangue para o lado e enxugou o rosto de suor misturado com o líquido vermelho.
“Levanta, seu merda... você não pode se dar o luxo de morrer... seu povo precisa de você... LEVANTA!” pensou ele, socando a terra do chão com a mão direita.
O líder finalmente se levantou.
E antes que pudesse voltar ao normal, já foi atacado novamente por mais dois infectados comuns.
— UFF!!!
Arthur levou vários socos na cabeça. O máximo que podia fazer era colocar as mãos na frente e torcer para não ser mordido.
O líder se jogou no chão de novo e teve que lidar com os monstros assim mesmo.
— AH... PORRA!
Ele segurou o pescoço de um infectado com as duas mãos enquanto chutava o outro que tentava pular em cima dele com o pé direito.
A situação estava cada vez mais precária.
Até que o soldado que tinha quebrado a linha de defesa para ajudar o líder finalmente havia chegado.
O rapaz acertou um chute violento na cabeça do infectado que Arthur empurrava com o pé direito e, antes mesmo que o monstro tivesse tempo de reagir, golpeou diversas vezes com a ponta do escudo, destruindo o crânio do infectado.
Arthur aproveitou a ajuda que teve para matar o último maníaco que estava tentando subjugá-lo.
O líder apertou com tanta força o pescoço do infectado que ele começou a perder forças.
Daí a situação se inverteu: Arthur ficou por cima do monstro, socando várias vezes sua cabeça, até matá-lo.
— UFF... UGH... PUTA QUE PARIU... AINDA NÃO ACABOU... VAMOS! — disse o líder, tentando recuperar o fôlego.
O combatente que o tinha ajudado estendeu a mão para levantá-lo do chão, porém antes dele aceitar a ajuda, o pobre rapaz recebeu um forte golpe na lateral do corpo, desabando longe dali.
— PORRA!!! — urrou Arthur, assustado com o ocorrido e preocupado com a integridade física de seu soldado.
O homem já caiu desacordado.
E quem tinha feito isso foi o mesmo Touro que havia atacado o líder.
Arthur engatinhou o mais rápido que pôde na direção do escudo e quando finalmente conseguiu empunhá-lo, o Touro o alcançou.
“ROAAARGH!”
O imenso infectado desferiu vários socos na direção de Arthur, que só teve tempo de segurar firme o escudo e aguentar as pancadas.
Os golpes no escudo blindado foram tão fortes, mas tão fortes, que amassaram o objeto.
Para piorar, a última pancada fez com que Arthur caísse de costas no chão, por cima de vários corpos de infectados ensanguentados.
— Droga!!!
O escudo escorregou de sua mão novamente e tudo o que ele podia fazer agora era esperar pela morte certa.
O Touro se aproximou do indefeso líder, cerrou os punhos, levou-os até o alto, e quando foi descer com um golpe fatal, alguma coisa o parou.
Durante toda essa confusão, Luiz Felipe tinha pego uma corda, fez um laço e jogou em volta do pescoço do Touro, puxando-o para trás e desequilibrando-o.
— MAS QUE PORRA É ESSA? — indagou Arthur, deitado no chão e ainda incrédulo com aquela cena.
— CORRA! SAIA DAÍ! — ordenou o encapuzado, puxando a corda com toda a força que tinha.
O Touro cambaleou sem entender o que estava acontecendo, tropeçou nas próprias pernas e desabou no chão da praça.
Antes que ele pudesse se recompor, Arthur correu até o machado e assobiou para atrair a atenção do homem encapuzado.
— AQUI! — gritou ele, jogando o machado na direção de Luiz Felipe.
O rapaz pegou a arma ainda no ar e golpeou com toda sua força o crânio do infectado especial, fazendo-o urrar de dor.
Uma, duas, três, quatro pancadas foram desferidas na cabeça do Touro, até que finalmente o crânio foi destruído em vários pedaços.
E a batalha tinha chegado ao fim.
A horda foi contida pelos combatentes e a dupla conseguiu matar o gigante de quase três metros.
Todos os homens tentavam recuperar o fôlego, pois aquilo tinha sido muito intenso.
Arthur passou as mãos no rosto para tirar o excesso de sangue e encarou o encapuzado.
— Quem é você? — perguntou o líder, caminhando lentamente na direção do rapaz.
— É mais fácil você perguntar o que eu sou... — respondeu Luiz, tirando o capuz devagar.
E quando a aparência do homem se revelou à luz do dia, Arthur não conteve sua expressão de assustado.
— Você... você é um deles?
— Não necessariamente. Não sei explicar, mas... sobrevivi a infecção… de alguma forma... — confidenciou Luiz Felipe, encarando o boquiaberto líder.
Os soldados de Arthur caminharam até ficar ao lado dele e empunharam as armas na direção de Luiz.
— E agora, senhor? Matamos essa coisa ou não? — indagou um os combatentes, completamente sujo de sangue dos doentes.
Arthur respirou fundo, fixou o olhar no infectado especial assassinado no chão e depois voltou a vista na direção do rapaz que salvou sua vida.
— Não. Ele me salvou. Esse rapaz… eu não sei qual é a dele, mas quero ter uma conversa a sós. Vamos voltar para o acampamento, lá eu vejo o que fazer… agora precisamos descansar! — disse ele, enquanto tentava controlar a respiração e limpava o excesso de sangue do rosto.
A maioria dos homens encarava Luiz Felipe com medo e nojo no olhar, mas não era para menos.
Um estranho, que chegou do nada e salvou o líder da morte certa, mas que parecia um infectado.
Não seria fácil conquistar o respeito daquele pessoal, porém era algo necessário.
Onde mais teria um grupo tão organizado e forte como aquele?
Era disso que Luiz Felipe precisava se quisesse obter sua vingança contra o Coronel.
Ele precisava ganhar a confiança deles o mais rápido possível.
Encontrar o seu antigo grupo agora não era mais a tarefa principal, e sim uma secundária.
Luiz precisava conhecer melhor essas pessoas e julgar se valia a pena uma aliança ou não.
A maré estava virando a favor dele.
Aos poucos, mas estava.