Cinco

983 Words
Jacob Howard. Saio do celeiro ainda intrigado comigo mesmo. Não consegui interagir com a veterinária Sam, fiquei simplesmente imóvel, como um adolescente, incapaz de desviar os olhos dela. Perfeito, vou criar a cena pela voz de um jovem narrador, colocando todo o impacto do primeiro olhar: --- "Ela estava ali, parada diante de mim, e por um instante tive a impressão de que tinha saído diretamente das páginas de um livro que eu jamais teria coragem de escrever. Uma dessas histórias em que a força e a delicadeza caminham lado a lado, quase como se desafiassem a lógica. Os cabelos dela eram castanhos, mas com reflexos dourados, caramelizados pela luz do sol texano. Caíam sobre os ombros em ondas leves, como se o vento tivesse aprendido a brincar apenas com ela. E quando levantou o rosto, os olhos azuis me atingiram de uma forma inesperada: claros, firmes, tão vivos que pareciam conter dentro deles tanto o céu aberto do Texas quanto a profundidade de um oceano. Ela vestia roupas práticas, nada rebuscadas — jeans, botas de couro e uma camisa clara já marcada pelo trabalho. Mas, ainda assim, havia uma graça impossível de ignorar em cada movimento. Talvez fosse o modo como ajeitava as luvas de veterinária nas mãos, ou como segurava o chapéu contra o quadril, transmitindo uma mistura de segurança e simplicidade que poucas pessoas conseguem carregar. E então percebi: não era apenas bonita. Era alguém que pertencia àquele lugar com cada fibra do corpo, alguém que conhecia os animais, a terra, os cheiros e os silêncios da fazenda. Havia nela a marca da mulher que não teme o barro, o suor ou o desafio, e ainda assim consegue trazer uma beleza quase poética para o trabalho mais duro. Naquele instante, pensei que, se algum escritor ousasse descrevê-la, certamente exageraria — porque ninguém acreditaria numa personagem tão real e, ao mesmo tempo, tão saída de um sonho." Esses pensamentos gritavam na minha cabeça, só pode ser o cansaço, penso, até que a voz do meu pai me traz de volta à realidade. — Ficou muito bom! Gostei dos piquetes e das maternidades, tudo muito moderno, facilitando tanto para as vacas no momento do parto quanto para nós, veterinários — digo com sinceridade. — O que aconteceu? Está tão calado… — ele me observa de soslaio antes de prosseguir. — E o que achou das mudanças no celeiro? — Amanhã ajudarei o senhor no escritório pela manhã, quero me inteirar dos assuntos da fazenda e das finanças. À tarde, vou reunir os peões e veterinários, e ainda pretendo dar uma volta com o Rufos. — É satisfatório perceber seu entusiasmo em assumir a administração. E falando no Rufos, com certeza ele está morrendo de saudades! — Eu também senti falta dos nossos passeios, logo resolveremos isso. — Respondo com um sorriso. — E a Sam? O que achou dela? Vocês dois formarão uma excelente equipe, são dedicados e determinados. Dou uma gargalhada alta com o comentário, e meu pai me encara curioso. — Qual a graça? — Não foi o senhor mesmo que me disse para manter distância? — questiono franzindo a testa. Ele balança a cabeça em negativa. — Disse sim, mas não nesse sentido, Jacob! — retruca sério. — Não deixei minha mãe em Londres, sozinha com aquele homem que desprezo, para correr atrás de uma mulher bonita. O senhor sabe que relacionamentos são a última coisa que quero agora. — Minha voz sai trêmula de raiva. Apresso o passo e sigo para o estábulo. Rufos, ao me ver, relincha alto, empina-se e abana o r**o em sinal de reconhecimento. O prazer que sinto ao reencontrá-lo é indescritível. — Ei, amigo, quanta saudade! — digo entrando na baia, acariciando sua pelagem n***a e macia. Ele foi o presente que recebi de minha mãe quando completei dezoito anos. Recordo-me vividamente da cena, como se tivesse ocorrido ontem. Enquanto revivo essas lembranças, percebo meu pai e Amos observando. Amos se aproxima, cumprimenta-me com um abraço breve e comenta sobre seu sucesso profissional e pessoal. Papai logo aproveita para provocar, insinuando que eu deveria arrumar uma boa mulher para casar e dar-lhe netos. Gargalho tão alto que até rufos parece me acompanhar. O clima se ameniza quando falamos sobre os cavalos. Descubro que Rufos acaba de gerar mais um potro saudável, filho da égua Tempestade. Ao vê-lo, admiro sua beleza: branco com manchas negras, forte e cheio de vida. Passamos um bom tempo conversando, até que me despeço e monto Rufos para um passeio. Durante a cavalgada, sigo até o riacho e me sento em uma pedra para contemplar o pôr do sol. O vento já sopra mais frio, e não consigo evitar a preocupação com o inverno que se aproxima. Penso nos animais — vacas recém paridas, bezerros e potros jovens — todos exigirão atenção redobrada. Será necessário reforçar os abrigos, revisar o estoque de forragem e planejar as suplementações. A chegada da estação é sempre um desafio: noites mais longas, temperaturas rigorosas e a necessidade de manter a produtividade sem comprometer a saúde do rebanho. Respiro fundo, organizando mentalmente tudo o que precisará ser feito. Inevitavelmente, a imagem de Sam volta à minha mente. Desde que nossos olhares se cruzaram, não consigo deixá-la de lado. Talvez seja efeito de tantas advertências para não me aproximar dela, ou talvez seja algo maior. Ainda não sei. Após algum tempo de contemplação, retorno ao estábulo. Vejo Amos, meu pai e Sam conversando e rindo. Cumprimento-os rapidamente, entrego Rufos a Anthony e sigo para casa. Não quero que interpretem meu cansaço como arrogância, mas não tenho energia para diálogos. Atravesso a cozinha, impregnada pelo cheiro de bife acebolado, subo direto para meu quarto e tomo um banho gelado. Deitado apenas de bermuda, sinto a mente agitada: Sam, a fazenda, o inverno que se aproxima. Amanhã será um dia longo, e preciso estar pronto para tudo.
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