Xeque-Mate

1360 Words
O caos no salão de baile se solidificava em um silêncio pesado, um silêncio que só a presença da lei pode impor. Eu permaneci no meu lugar, a taça de champanhe ainda em minha mão, a calma de um homem que sabia que era intocável. A minha mente, uma máquina de cálculo, já estava rodando a toda velocidade, analisando os danos, prevendo as consequências, planejando o próximo movimento. A perda de alguns clientes era insignificante. Eles seriam substituídos. A minha rede era vasta. A jogada dela, a delegada que eu só conhecia pelo nome, Eliza Ferraz, era apenas o primeiro movimento em um jogo de xadrez. Eu a havia subestimado, sim, mas não a ponto de não me preparar. E o fato de que ela estava me dando um trabalho extra apenas me fazia sorrir, eu sabia que ela viria. A vida, afinal de contas, era um jogo de caça, e eu era o caçador. Ela era a presa, uma presa inteligente, mas ainda assim uma presa. Eu me deleitava com a ideia de desmantelar a operação dela, de mostrar que, por mais implacável que ela fosse, ela não era párea para mim. Não havia chance de que uma mulher, sozinha, pudesse me derrubar. Eu era o rei das sombras, e ela era apenas uma delas. Foi neste momento de absoluta confiança que senti a mão no meu ombro. Uma mão delicada, mas firme, com a força de um aperto que não pedia, mas ordenava. A sensação era estranha, pois eu havia treinado por anos para nunca ser tocado por ninguém que eu não quisesse. E a minha rede de segurança era, ironicamente, tão impenetrável quanto as minhas minas na selva. A minha mente, por uma fração de segundo, registrou a falha na segurança. Como aquela mulher havia chegado até mim? Por que os meus homens não a interceptaram? A resposta, eu sabia, viria mais tarde. Agora, eu tinha que agir. E eu agiria como Gabrian Varella, o homem de negócios. Girei lentamente, o meu sorriso charmoso em meu rosto, pronto para cumprimentar quem quer que fosse. Mas o sorriso desvaneceu-se assim que meus olhos se encontraram com os dela. E em um flash, eu soube. O olhar. O olhar aguçado que meu assistente havia mencionado em seu relatório. O olhar que parecia enxergar através do meu verniz, através da minha farsa. Ela era ainda mais linda pessoalmente do que o meu Anjo Caído havia me mostrado em fotos e vídeos. Seus cabelos, pretos como a noite sem estrelas, estavam presos em um r**o de cavalo alto e firme, revelando uma nuca esbelta e um pescoço longo. Os olhos, de um castanho tão escuro que quase parecia preto, eram de uma intensidade que me desestabilizou. Eles eram como buracos negros, sugando toda a minha calma e jogando-a em um universo de desordem. Os lábios dela, perfeitos e cheios, não estavam sorrindo. O seu rosto era uma máscara de seriedade, uma máscara que parecia desafiar a minha. Eliza Ferraz. O nome ecoou na minha mente, e desta vez não foi um sussurro frio, mas um grito ensurdecedor. O jogo havia mudado. Ela não estava na sombra. Ela estava bem ali, na minha frente, em plena luz do dia, desafiando-me no meu próprio jogo. "Senhor Gabrian Varella?" ela perguntou, sua voz era baixa e rouca, sem qualquer traço de cordialidade. Era uma voz que não pedia, mas ordenava. Eu me perguntava se ela sabia o que a voz dela fazia com os meus nervos. "Sou eu," eu respondi, o meu sorriso agora um reflexo forçado, uma máscara que eu usava quando estava em perigo. "E você, quem é?" Ela não sorriu. Não houve nenhum brilho em seus olhos. A sua expressão era de aço. "Delegada Eliza Ferraz. Eu gostaria que o senhor me acompanhasse." A sua hostilidade me pegou de surpresa. Eu estava acostumado a ser tratado com admiração e respeito. Mulheres flertavam comigo, homens me bajulavam. Mas ela me tratava como um criminoso, como um bandido, como se ela já soubesse o que eu era por baixo do meu terno de gala. E o pior, ela me chamou pelo nome. Ela não me chamou de Senhor Varella, ela me chamou pelo nome. O que ela sabia? Como ela sabia? As perguntas giravam na minha mente, um furacão de pânico que eu me forcei a ignorar. O meu rosto, por uma fração de segundo, revelou a minha surpresa, mas rapidamente se recuperou. Eu dei uma risada baixa, uma risada que era mais uma tosse do que qualquer outra coisa. "Delegada? Eu não sei por que a senhora gostaria que eu a acompanhasse. Eu não tenho nada a ver com essa situação." "O senhor tem uma rede de joalherias de luxo, a Varella Jewels," ela disse, seus olhos fixos nos meus, sem piscar. "E alguns dos clientes que acabamos de prender foram vistos em suas lojas. E a sua empresa, a Varella Global Assets, tem transações financeiras com empresas de fachada que estão sendo investigadas por tráfico de joias. Eu não estou aqui para conversar. Eu estou aqui para ter uma conversa oficial com o senhor. E eu não tenho a intenção de ser educada." As suas palavras, como lâminas afiadas, perfuraram a minha confiança. Eu não sabia como ela havia conseguido essas informações. Eu era o homem que controlava a informação. Eu era o fantasma. E ela, a rainha das sombras, havia me achado. Eu sentia que cada um de seus nervos estava tensionado, como se ela estivesse pronta para pular em mim a qualquer momento. O meu plano, de ser a sombra que a perseguia, havia falhado. Eu não era mais o caçador. Eu era a presa. O jogo havia virado. E a minha mente, por mais que eu tentasse, não conseguia se reorganizar. Eu dei um sorriso, o meu último sorriso de arrogância. "Delegada, eu não tenho nada a esconder. Eu sou um homem de negócios. E eu tenho advogados que podem confirmar tudo o que eu digo." "Vamos ter certeza disso," ela respondeu, a voz gelada. "Agora, me acompanhe, senhor Gabrian Varella." Eu segui-a. Os meus homens, que estavam a uma distância de segurança, olhavam para mim, os seus olhos questionando. Eu lhes dei um sinal imperceptível com a cabeça. Era uma ordem para não fazer nada. Para não me protegerem. Eu precisava saber o que ela sabia. Eu precisava saber o que ela queria. E a única maneira de saber era ir com ela. O caminho para o carro de polícia foi longo. A multidão, que momentos antes me olhava com admiração, agora me olhava com curiosidade. Alguns sussurravam, e eu podia ouvir o meu nome sendo pronunciado. Eles estavam chocados. Gabrian Varella estava sendo levado pela polícia. Eu, o homem que eles achavam que era intocável. A sensação de ter o meu nome e a minha reputação manchados, mesmo que temporariamente, me irritou profundamente. A viatura de polícia era o oposto do luxo do meu carro. Ela era apertada, escura, e o cheiro de borracha e metal me fazia querer vomitar. Eu me sentei no banco de trás, e ela, a delegada, sentou no banco da frente, ao lado do motorista. Ela não olhou para trás. A sua atenção estava em seu rádio, em seu celular, em seus papéis. Ela me ignorava, como se eu fosse apenas uma peça de mobília. Eu me senti humilhado, mas não demonstrei. Por dentro, a minha mente estava a mil por hora. Eu tinha que me recompor. Eu tinha que pensar em uma maneira de sair dessa situação. Eu tinha que me preparar para o que estava por vir. E eu tinha que descobrir o que ela, Eliza Ferraz, a mulher de olhos castanhos escuros e hostilidade fria, sabia sobre mim. "Para a delegacia central," ela disse ao motorista, a voz agora um pouco mais suave, mas ainda com a força de uma ordem. "Eu quero interrogá-lo pessoalmente." A sua declaração era um desafio. E eu, Gabrian Varella, o homem que sempre aceitava um desafio, não podia recusar. O jogo havia mudado, e o tabuleiro havia sido virado. E pela primeira vez, eu não era o único que controlava o jogo.
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