A mansão Cavalcante nunca estivera tão iluminada.
Candelabros reluzentes pendiam do teto, os músicos afinavam os instrumentos e os salões exalavam perfume de flores frescas trazidas do campo.
O baile cuidadosamente planejado por Francesca era o evento mais aguardado do mês.
O propósito, porém, não era apenas celebrar.
Francesca queria exibir a riqueza da família, consolidar alianças… e, acima de tudo, encontrar uma noiva adequada para o filho.
Vestida com um esplêndido vestido de seda, a matriarca observava os convidados chegando. Os risos, as taças tilintando, as jovens debutantes circulando com sorrisos estudados tudo corria exatamente como ela havia planejado.
No entanto, Estefano mantinha-se distante.
Encostado junto à varanda, a taça de vinho nas mãos, observava a multidão com um desinteresse crescente.
As moças se aproximavam rindo, elogiando, lançando olhares tímidos ou ousados, mas ele via todas da mesma forma: sem graça, sem alma, sem verdade, sem brilho.
Sua mente estava em outro lugar… ou melhor, em outra pessoa.
A cada acorde da valsa, ele se perguntava o que Amélie estaria fazendo naquele momento.
Provavelmente trabalhando nos bastidores da festa lavando, servindo, limpando invisível como sempre.
Na cozinha, o clima era bem diferente do salão luxuoso.
O vapor das panelas, o barulho dos pratos e o cheiro forte de vinho e sabão tomavam conta do ambiente.
Amélie, de mangas arregaçadas, lavava taças de cristal com cuidado, temendo quebrar qualquer uma daquelas peças que valiam mais do que ela possuía na vida.
O suor escorria por sua têmpora, e as mãos, já avermelhadas, tremiam um pouco de cansaço.
Atrás dela, um homem um dos convidados mais jovens, já embriagado e de riso fácil havia se perdido do salão principal e entrado ali, atraído pela curiosidade… e pela visão da moça.
— Ora, o que uma beleza dessas faz escondida aqui? — disse ele, apoiando-se no balcão.
Amélie se assustou, mas manteve o olhar baixo.
— Eu… estou trabalhando, senhor. Por favor, o salão é por ali.
— Trabalhando? — ele riu, aproximando-se demais. — Que desperdício… com esse rosto, deveria estar dançando. Quer que eu te leve lá?
Ela recuou um passo, o corpo tenso.
— Eu agradeço, mas não posso.
— Oh, pode sim — insistiu o homem, inclinando-se para perto dela. — Ninguém vai sentir falta de uma taça ou duas.
Quando ele tentou tocar-lhe o braço, Amélie se afastou bruscamente, deixando uma das taças cair o som do cristal quebrando cortou o ar.
O homem riu, dando mais um passo.
— Tão delicada…deixa eu tocar em você vai
Foi então que uma voz profunda ecoou da porta:
— Afaste-se. Agora.
O homem se virou, surpreso, e empalideceu ao ver Estefano Cavalcante parado na entrada, o olhar frio como aço.
O silêncio que se seguiu foi denso, ameaçador.
— Estefano… eu… estava apenas—
— Saia. — a ordem veio cortante, sem espaço para réplica.
O convidado gaguejou, fez uma reverência desajeitada e escapou pela porta lateral, o som dos passos apressados se perdendo pelo corredor.
Estefano ficou ali, o peito subindo e descendo, ainda tomado pela raiva.
Quando olhou para Amélie, ela estava parada ao lado da mesa, os olhos marejados, tentando se recompor.
— Ele te machucou? — perguntou, a voz mais suave agora.
Ela balançou a cabeça.
— N-não… só me assustou.
Ele deu um passo à frente, e o olhar dele se suavizou.
— Você não devia estar aqui, Amélie, é bonita demais para ficar exposta assim.
— Onde mais eu deveria estar? — respondeu, com um sorriso triste. — Sua mãe me colocou para lavar as taças. E eu… obedeço.
Estefano sorriu com a inocência dela.
— Seu jeito delicado me encanta, Amélie.
Por um instante, o silêncio os envolveu. O som distante da orquestra, o brilho das luzes refletindo nas taças molhadas, e entre eles algo não dito, que queimava em silêncio.
Estefano estendeu a mão, hesitante.
— Venha comigo. Só por alguns minutos.
— Eu não posso — sussurrou ela. — Se me virem fora da cozinha…
Ele deu um meio sorriso, determinado.
— Então, que me vejam ao seu lado.
— Senhor...eu não posso, por favor.
— É uma ordem, Amélie.