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1405 Words
Depois que Benicio foi embora, tranquei-me em meu quarto e fiquei a pensar mais calmamente nos acontecimentos do dia anterior. Passei o restante da tarde – começo de noite – em meu quarto. Estava sem fome. Por algum motivo – bem óbvio – a rejeição de Albert me afetaria além do que eu esperava. Troquei de roupa e decidi me deitar cedo. Queria que o dia logo amanhecesse. O convite do Padre Robert me deixara eufórica. Não conseguia pensar em outra coisa. Tanto que preferira aceitar a proposta de Benicio, só para me recolher o quanto antes e ter tempo de pensar. Graças aos céus, logo adormeci. Acordei cedo como de costume, fiz minha higiene e segui para a cozinha. Beijo Alda e pego uma maçã. – Aonde vai tão cedo? – Ajudarei no sopão da igreja – digo enquanto saio pela porta. A carruagem estava pronta. Entrei e seguimos para a igreja. O cocheiro a estacionou próximo a porta de entrada lateral. Entro e sigo pelo corredor. Acabo por esbarrar em alguém e derrubar várias cebolas no chão. – Desculpe, eu sou uma desastrada… – quando fitei a pessoa a minha frente, senti meu coração disparar – desculpe Padre Albert. Ele recolhe o restante das cebolas caídas. – Tudo bem. – Padre Robert pediu que eu viesse… – É, mas, já temos ajuda o suficiente – diz rispidamente e saí. Sigo-o e dou de cara com uma enorme cozinha. Fora ele, havia mais duas pessoas trabalhando ali. – Será que posso ajudar em algo? – indago da porta. As duas mulheres me olham. – Bem precisamos de… – Não precisamos da sua ajuda – Albert interrompe rispidamente. Olho-o confusa, magoada e com raiva. Permaneço ali alguns segundos antes de sair. Bato a porta fortemente e sigo pelo corredor. – Audrea – ouço sua voz. Paro e o encaro. Ele se aproxima a passos largos. – Desculpe – diz – tive uma noite r**m, não dormi bem, mas, isso não é motivo para que lhe destrate. Olho-o mais fingindo que aceitava suas desculpas, do que verdadeiramente aceitava. – Pode ajudar com a cebola? Precisamos terminar até ao meio dia. Respiro fundo. – Claro. Voltamos para a cozinha e uma das mulheres me passou uma touca e um avental. Peguei a faca e comecei a picar as cebolas. Por volta de 11:30horas, terminamos o processo de cozimento da sopa. As duas mulheres puseram os pratos em cima da enorme mesa e começamos a enchê-los.. Albert e eu ficamos na cozinha, enquanto as mulheres íam levando os pratos para uma bancada que dava acesso para o pátio. Onde poucos minutos depois, os bancos que ali tinham, ficaram repletos de sem tetos; homens, mulheres e várias crianças famintas. Ao término de minha missão, sentia-me grata. Pude notar o quanto tinha sorte, tinha tanto, e ver aqueles pobres coitados com tão pouco e outros em casos extremos sem nada, era de partir o coração. – Obrigado – diz Albert recostado a pia. Sorrio rapidamente e aproximo-me da pia para lavar as mão. Tiro a touca e um emaranhado de cachos caem em meus ombros. Os grampos saltaram de meu cabelo quando puxei a touca. Pus as mãos debaixo da torneira e peguei uma barrinha de sabão. Albert se afastou um pouco e ficou a me observar. – Vocês sempre fazem isso? – pergunto. – A cada quinze dias. Queríamos fazer mais vezes, mas, precisamos de tempo para juntar os alimentos para que possamos ter o que fazer – diz com pesar. Seco as mão e tiro o avental. Ajeito um pouco os cabelos e tiro algumas lascas de verdura que estavam em minha roupa. Albert me observava. – Albert – ele fixa seu olhar no meu – me desculpe. Na verdade, me perdoe – ele permanecia calado – não sei o que aconteceu comigo, mas, prometo-lhe que jamais tornará a acontecer. Por isso eu lhe peço, não fique com raiva de mim. – Não estou com raiva de você Audrea – olho-o surpresa – apenas peço que cumpra o que está prometendo. Assento com pesar. Mesmo sabendo que o que fizera, fora errado, tinha gostado, e ansiava por mais. Sorrio e saio da cozinha. Passo pela porta, mas ele agarra meu braço. Ele fita minha mão e a acaricia. Olho-o surpresa, e ele me olha de volta. – Obrigado pelo apoio – diz. Sorrio. – Não há de que. Sempre que precisar, pode contar comigo. Ele sorri e me solta. Sigo pelo corredor, mas, antes que chegasse a porta, sinto uma presença atrás de mim. Viro e constato que era ele. – O que foi? – indago. Ele ficou me observando. – Padre Albert? Seus olhos encontraram os meus de uma forma estranha. A mesma forma que me olhara na outra noite, e que me deixara confusa e me fez agir de forma desordenada. – Audrea eu… – ele me olhou de forma ainda mais intensa – eu, tenho algo a lhe dizer, mas… Não posso fazer isso. – O que? – Dizer a você. Há algo que me corrói, que acaba comigo a cada segundo que penso em você. É errado, é horrendo, é… – É amor – digo e ele me olha surpreso – é isso, não é? Percebo-o retesar, mas não queria deixar que isso acontecesse, e ele voltasse atrás em dizer o que sentia. – Eu nunca me senti assim antes – diz – sinto como se meu coração fosse explodir. Como se meus pensamentos de nada mais valessem, se você não estiver neles. Eu não consigo tirá-la de minha mente Audrea, e por mais que isso seja difícil para admitir, desde a primeira vez que a vi senti meu mundo mudar, sei o quanto é errado. Fiz uma escolha, e não posso voltar atrás. Ao mesmo tempo que estava feliz por ouvir tais palavras, tinha ciência do que ele falava. – Albert, eu não posso dizer que não o entendo, pois, sei exatamente o que está passando. Deus sabe como me sinto quando o vejo, quando ouço sua voz, quando ao menos penso em você – ele sorria envergonhado – sei o que sinto por você, e é amor. Ele pega minha mão e a acaricia. – Por mais que eu queira Audrea, sabe o quanto isso é errado. – Será que é realmente errado? Eu nunca me senti assim antes. Sei que sua condição dificulta ainda mais a situação, mas, o que posso fazer? Me apaixonei por você. Ele sorriu ainda mais. Ouvimos barulhos e ele olhou para trás. – Quero conversar melhor com você. Poderia me encontrar hoje a noite? – Onde? – Na fronteira de Salvatore. – Tudo bem. Ele sorri e beija minha mão. Recolho-a sorridente. Sigo para a porta de saída e encontro o cocheiro a minha espera. Quando saímos do beco, dou de cara com Benicio. – Benicio – o cocheiro para a carruagem – o que faz por aqui? Ele me olha um tanto seriamente. – Vim visitar um velho amigo. Ele está muito doente. – Entendo. Sinto muito. Ele sorri gentilmente. – E você? Vi que saia da igreja… – Vim ajudar no sopão. Padre Robert solicitou minha ajuda, então, vim ajudar Albert. – Albert? – rebate. – Sim. O Padre Albert. – Sim… – retruca curioso – aquele que fora jantar em sua residência e saiu atrás de você… Assento um pouco desconfortável. – Bem, preciso ir. Estou exausta. Tenha um bom dia Benicio. – Você também Audrea. Tenha um ótimo dia. Despeço-me dele e sigo para casa. Fito a mão que Albert beijara e sorrio novamente. Sim, ele sentia o mesmo que eu, mas, como ele mesmo dissera, a situação era complicada. Mas, o que mais me intrigava, não era o fato de a situação ser complicada, e sim, de ele ter me dito o que sentia, em tais circunstâncias. O cheiro de cebola e alho ainda era nítido em mim. Ele não poderia esperar por uma oportunidade mais propícia? – rio ao pensar. Não, ele não poderia esperar. Assim como eu não queria esperar. Cada coisa em seu tempo. Mas, mesmo levando tal ditado tão a sério, a ânsia de ficar esperando para encontrá-lo a noite já começara a me consumir. Procurei aquietar meus pensamentos e sentimentos, para que mamãe e papai não percebessem. Até porque, teria de sair a surdina, para que não dessem de minha falta e não atrapalhassem meus planos.
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