Capítulo 12

1628 Words
Sebastian Na noite anterior, mandei tirar a cama de hóspedes do quarto dela. Uma provocação calculada. Queria testar seus limites. Forçá-la a dividir espaço, a respirar o mesmo ar, a se lembrar em cada centímetro daquele quarto de que agora ela pertencia a mim. Ainda que gritasse o contrário. Na manhã seguinte, saí antes que ela acordasse. Não queria troca de farpas antes do café. Mergulhei em reuniões, contratos, papéis que valiam mais que pessoas. Estava decidido a manter a mente ocupada. E foi aí que o erro aconteceu. Ou talvez... o inevitável. Lara apareceu. Surgiu como um perfume doce demais, um vestido vermelho curto demais e aquele olhar pintado de promessas que eu já conhecia bem. — Está tenso, Sebastian — ela disse, atravessando o escritório com a confiança de quem já havia estado ali. — Quer que eu te ajude a esquecer? Eu devia ter mandado embora. Mas não mandei. Ainda não havia aliança no dedo. Ainda não havíamos feito votos. Era só um contrato. E Lara... sempre soube ser conveniente. Minutos depois, estava nos meus braços. Beijos mornos, toques mecânicos, uma distração qualquer. Até que a porta se abriu. Sem aviso. Sem batida. Eu ainda segurava Lara pela cintura quando Ane surgiu na entrada do escritório. Ela congelou. Um instante. Os olhos, escuros e largos, fitaram a cena como se rasgassem a pele do meu peito. Não gritou. Não fez escândalo. Apenas me olhou com uma frieza cortante. Um silêncio que doeu mais do que qualquer palavra. — Senhorita! — a secretária surgiu logo atrás, aflita. — Me desculpe, eu ia anunciar... Mas já era tarde. Ane recuou um passo, virou-se com elegância c***l e desapareceu. Aquilo me destruiu. Porque ela não se deu ao trabalho de gritar. Não quis me odiar em voz alta. E isso doeu mais. Lara ainda tentou murmurar alguma coisa, mas bastou um olhar meu e ela desapareceu. Eu já estava atravessando o corredor como se minha casa tivesse pegado fogo. — Ela está no quarto de hóspedes — disse Vittoria, ao cruzar comigo no corredor, sem nem disfarçar o desprezo. — E, sinceramente? Você mereceu. Subi. A porta estava entreaberta. Ela estava de costas, sentada perto da janela. A luz da tarde recortando sua silhueta. Cabelo preso de qualquer jeito. Camiseta larga. Pernas dobradas. Um livro que ela claramente não lia. Linda. Linda de um jeito que me irritava. Linda mesmo me odiando. — Entrar sem ser anunciada — falei, cruzando os braços. — Novo hábito ou só um lapso de bom senso? Ela virou o rosto. Devagar. O olhar dela... cortava. — Sou sua noiva. Não preciso de permissão pra ver meu futuro marido se esfregando com outra. O golpe foi direto. Certeiro. — Você não devia ter ido até meu trabalho — retruquei, tentando recuperar o controle. — Aquele não é um lugar pra você. — E aqui é? — ela disparou, se levantando num salto. — Você me trancou com um homem que beija outra no mesmo dia em que me promete p******o? A respiração dela estava acelerada. Os punhos cerrados. — Por que foi até lá? — Queria ver meu pai — respondeu, a voz tensa. — E o seu segurança disse que eu precisava de autorização. Fechei os olhos por um segundo. m***a. Uma ligação teria evitado tudo. — Mas agora eu vi o suficiente — ela continuou, com a voz cortante. — Sei exatamente com quem estou lidando. Ela se virou, mas fui mais rápido. Segurei seu braço com firmeza — não a machuquei, mas deixei claro que não a deixaria ir. — Ninguém vai te tocar, Ane — rosnei. — Se um homem sequer pensar em você, eu mato. Ela riu. Frio. Implacável. — Isso tem outro nome, Sebastian: prisão. — Chame como quiser. — Você transa com quem quer, e eu sou obrigada a aceitar? — Ela deu um passo à frente. Nossos rostos quase se tocaram. — Talvez eu também devesse buscar distrações. O sangue ferveu nas veias. — Não. — Minha voz saiu baixa, grave. — Vai me impedir? Vai me manter numa coleira? — Você é minha — falei, cada palavra carregada de uma verdade sombria. — E ninguém toca no que é meu. Ela tentou se soltar, mas me aproximei ainda mais. Meu corpo colou no dela. O calor entre nós era sufocante. Baixei o rosto devagar, o nariz roçando sua pele, até minha boca pairar a milímetros da dela. Ane prendeu a respiração. O corpo dela tremia, não de medo, mas de algo mais denso, mais sujo. Desejo. Seus olhos escureceram. As coxas se apertaram uma contra a outra. O tecido leve da calça não escondia a verdade que eu já sentia: ela estava molhada. E isso só incendiou o que já ardia dentro de mim. — Eu não me divirto, Ane — murmurei contra seus lábios. — Eu sobrevivo. E você... você me tira do controle. Ela fechou os olhos. Arfou. O corpo todo tenso. Pronto. Quase implorando. — Me beija — provocou, a voz rouca. Mas eu não beijei. Encostei a testa na dela. Um gesto íntimo. c***l. — Ainda não, pequena. Quando eu te beijar... vai ser pra te marcar. E você ainda não está pronta pra me pertencer desse jeito. Soltei seu braço devagar. Ela recuou um passo. Os olhos em chamas. A boca entreaberta. As pernas instáveis. Virou-se e saiu do quarto. Fugindo. Mas não do medo. Do próprio desejo. E eu fiquei ali. Com o gosto da provocação na boca. Sabendo que, mais cedo ou mais tarde... ela voltaria. E quando voltasse, não haveria mais recuos. Nem dela. Nem meus. Ane Quando acordei no meio da tarde, a casa estava mergulhada num silêncio denso, quase cúmplice. O chá na mesinha já estava frio, intocado, assim como eu — congelada em lembranças que pareciam pesar toneladas no peito. Nana me encontrou no corredor. Seu olhar percorreu meu rosto como se lesse nas entrelinhas da minha alma. E talvez lesse mesmo. Ela não perguntou nada, apenas estendeu a mão e me guiou até a cozinha. Sem dizer uma palavra, preparou outro chá — quente dessa vez, com mel e limão — e o colocou entre minhas mãos com um gesto tão delicado que doeu. Ternura era uma coisa rara naquele lugar. Mas ela me oferecia como se dissesse: “ainda há algo de humano aqui.” Foi nesse instante, com os dedos envolvendo a porcelana morna, que o celular vibrou sobre a mesa. [Sofia]: As respostas que você procura estão aqui. Vai doer. Abri a mensagem. Havia um arquivo anexado. Documentos. Fotos antigas. Registros. Provas. Li uma vez. Depois outra. E mais uma. Até não haver mais espaço para dúvida. Meu nome… realmente era Moretti. E eu nunca fui bastarda. A raiva subiu como maré em noite de tempestade. Forte, silenciosa, avassaladora. Tudo aquilo que me arrancaram — minha identidade, minha história, meu orgulho — poderia ter sido meu desde o começo. Mas eles sabiam. Sebastian e o pai dele sempre souberam. Mentiram. Me esconderam. Me usaram como peça em um jogo sujo que eu nem sabia estar jogando. Quando terminei de ler, subi as escadas sem dizer uma palavra. Meus passos eram firmes, mas o peito… em brasa. Fui até o quarto de Vittoria. Bati uma única vez antes de entrar. Ela estava sentada na cama, com um livro no colo, e me olhou surpresa. — Preciso do quarto de hóspedes — falei. — Só por hoje. Eu… não consigo ficar lá. Vittoria não hesitou. Apenas levantou e me acompanhou. Em silêncio. Quando entramos, fechei a porta com um estalo e desabei. Contei tudo. Sobre a cena no escritório. Sobre Sebastian com outra. Sobre como ele nem sequer tentou esconder. Como se eu fosse invisível. Como se o acordo entre nós fosse uma licença para me humilhar. Ela permaneceu imóvel por alguns segundos. O maxilar travado. Os olhos faiscando. — Eu vou m***r aquele desgraçado — sussurrou por fim. — Mas… sinceramente? Isso não me surpreende. Nosso pai é ainda pior. Por isso eu escolhi ficar aqui com o Sebastian. Porque, mesmo com todas as sombras dele… há uma espécie de paz. Uma trégua. Paz. A palavra soou estranha naquela casa. Como um idioma esquecido. Deitei na cama do quarto de hóspedes. O celular ainda na mão. As provas da minha origem queimando a tela. O nome Moretti pesava agora como um trono. Um trono ensanguentado. Era uma arma. Uma bandeira. Uma maldição. Mas eu ainda não podia usá-lo. Não agora. O nome Moretti podia me proteger… ou me destruir. E eu não fazia ideia de quem realmente estava ao meu lado. Meu avô, talvez, soubesse de tudo. Talvez estivesse observando de longe. Esperando o momento certo para me puxar ou para me derrubar. Ou, pior… jogando junto com Sebastian desde o início. Como se eu fosse apenas mais uma peça no tabuleiro deles. Foi então que ouvi passos. Rápidos. Determinados. A maçaneta girou. E ele entrou, Sebastian. Os olhos dele me encontraram com precisão cirúrgica. Havia dureza neles. Havia controle. Mas também… havia perda. Um traço sutil, quase imperceptível, de quem não sabia mais exatamente onde estava pisando. A tensão se instalou como um perfume amargo no ar. Quente. Quase palpável. — Entrar sem ser anunciada — ele disse, com os braços cruzados, voz baixa, porém carregada de ironia. — É um novo talento seu? Ou só um lapso de bom senso? Virei o rosto devagar. E quando nossos olhos se encontraram, tudo dentro de mim gritou. Ele não fazia ideia… De que tudo estava prestes a ruir. De que aquela garota assustada que ele tentou dobrar… não existia mais. De que agora eu sabia exatamente o quanto ele merecia perder. E talvez fosse eu quem o faria cair.
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