Sebastian
Acordei sozinho na cama, o lado de Ane já frio. Estiquei o braço, ainda sonolento, e toquei o lençol vazio. Meus olhos correram pelo quarto, mas não havia sinal dela. Nenhum ruído, nenhuma presença. Por um segundo, talvez um breve segundo, cogitei me preocupar. Mas então meus olhos pararam sobre a mala no canto, a bolsa encostada na poltrona, e lembrei que ninguém entrava ou saía da minha casa sem ser notado. A segurança era impenetrável — literalmente.
Ela ainda estava ali, em algum lugar.
Levantei sem pressa, fazendo minha rotina matinal com a mesma precisão de sempre. Escovei os dentes, lavei o rosto, vesti uma camiseta branca simples. E, ao sair do banheiro, encontrei Vittoria sentada bem no meio da minha cama, com os braços cruzados e aquela expressão de julgamento disfarçado de doçura que só ela conseguia fazer.
— Você vai mesmo se casar com uma mulher que ganhou num jogo? — perguntou, sem rodeios.
Suspirei. Já devia ter previsto esse interrogatório.
— Vou.
— Sério? — ela arqueou uma sobrancelha. — Você não acha isso um pouco... absurdo?
— É negócio, Vittoria. — Dei de ombros. — E, de quebra, agora você tem companhia pra ir ao shopping.
Ela bufou, mas o olhar caiu nos pés da cama. Alguns livros empilhados de forma desajeitada chamaram sua atenção. Franziu o cenho.
— Não sei se vai funcionar, não. Sua futura esposa parece estudar.
Segui seu olhar e vi os livros. Títulos acadêmicos. Assuntos sérios. Me aproximei, peguei um deles.
— Ela estuda? — perguntei, mais para mim do que para Vittoria.
— Você achou o quê? Que ela passava o dia torrando dinheiro do pai em bolsas de grife?
— Sim — admiti, sincero. — Achei que fosse uma patricinha qualquer.
Vittoria revirou os olhos.
— Se é isso que pensa dela, então também pensa isso de mim.
Me virei, encarei minha irmã.
— Não. Você pode gastar o dinheiro que quiser. É pra isso que eu e o papai trabalhamos. Pra te dar o mundo.
Ela sorriu com ternura, como se não esperasse outra resposta.
— Você é um i****a. Mas um i****a que eu amo.
Se levantou e me deu um beijo na bochecha.
— Vou começar alguma faculdade.
— Vai nada — retruquei, rindo.
— Duvida? — Ela piscou. — Então espera. Vou buscar a Ane na biblioteca. A gente vai tomar café.
E saiu, tão leve quanto havia entrado, deixando para trás o perfume doce e a ideia incômoda de que eu talvez tivesse julgado Ane cedo demais.
Desci para a sala com a leve impressão de que o dia prometia mais do que reuniões e decisões empresariais. Vittoria já estava à mesa, com um croissant pela metade e Ane ao seu lado, de cabeça baixa, folheando alguns papéis. Óculos no rosto, cabelo preso de qualquer jeito, uma caneca de café fumegando ao alcance da mão.
— Bom dia — falei, me aproximando.
Ane ergueu os olhos, e por um segundo pareceu medir o humor do meu bom dia.
— Preciso ir — disse simplesmente. — Tenho uma prova na faculdade hoje.
Ela fez uma pausa e logo completou:
— Só vou subir rapidinho para pegar meus livros.
— Já mandei um dos seguranças preparar o carro.
Ela franziu a testa.
— Eu não preciso de segurança. Só preciso do meu carro.
Cruzei os braços, inclinei a cabeça. Ela ainda não tinha entendido, né?
— Não. Enquanto não estivermos casados, você só vai sair com segurança.
— Desculpa? — ela retrucou, rindo de nervoso. — Isso é algum tipo de prisão?
— É precaução. — Dei um passo à frente. — Preciso de alguma garantia de que você não vai fugir.
Ane se levantou com calma, os olhos agora em chamas.
— Se eu quiser fugir, Sebastian, eu fujo. Com ou sem seguranças.
A ousadia dela acendeu algo dentro de mim. Um calor inesperado. Eu deveria me irritar. Impor limites. Mostrar controle. Mas tudo que consegui fazer foi sorrir.
— É mesmo? — perguntei, me aproximando um pouco mais. — Você está me desafiando?
— Estou apenas sendo honesta.
— Gosto disso — confessei, baixando o tom. — Gosto quando você me desafia.
Ela bufou e pegou a bolsa com os livros.
— Então se acostume, porque eu não sou propriedade de ninguém.
— Ainda não — respondi, com um meio sorriso. — Mas vamos chegar lá.
Ela saiu andando com o segurança logo atrás, sem nem olhar para trás. E ali, sozinho na sala, percebi que essa história ia me dar muito mais trabalho — e prazer — do que eu imaginava.
Ainda na sala da casa, enquanto Ane subia as escadas para pegar os livros, Vittoria me olhou com aquela expressão que misturava divertimento e preocupação.
— Sebastian, você está gostando da menina que conheceu há menos de 24 horas. — Ela falou devagar, para que eu entendesse bem. — Isso é algo sério.
Revirei os olhos, fingindo desdém.
— Não. É só atração por algo que ainda não tenho.
Vittoria sorriu de lado, confiante.
— Não, tem algo a mais. Você não está enganado.
Fitei minha irmã por um instante, depois disse:
— Preciso ir.
Saí sem esperar resposta, caminhando para o carro onde o segurança já me esperava.
— Faça o acompanhamento até a faculdade. Quero saber se ela chega e sai sem problemas.
O homem acenou e arrancou.
Dirigi em silêncio, as engrenagens do meu cérebro girando em ritmo acelerado. Quando chegamos à faculdade, vi Ane sair do carro. Ela correu em direção a duas pessoas, e as abraçou com força.
Um homem e uma mulher — aparentemente amigos ou familiares.
Meus olhos se fixaram na proximidade dela com o homem. Algo ali não me agradou.
Puxei o celular do bolso e liguei para meu conselheiro particular.
— Quero um relatório completo sobre os amigos de Ane. Cada um deles. — Minha voz estava fria, controlada. — Quero saber tudo.
Desliguei, e meu pensamento já se voltava para outra missão.
Mais tarde, no coração da cidade, cheguei a um lugar que nunca frequentava sem um propósito claro: um bordel discreto, mas com influência poderosa em círculos ilícitos.
Empresários, políticos e criminosos negociavam ali sob a aparência de festas e prazer.
Adentrei o ambiente sem cerimônia, o ar denso de cigarros e conversas abafadas. O A porta escura e pesada rangeu quando empurrei para entrar no bordel. O ar quente, carregado de perfume barato, fumaça de cigarro e murmúrios abafados me atingiu como uma parede. Luzes vermelhas piscavam, criando sombras oscilantes nas paredes estofadas em veludo. O som distante de um piano arranhado se misturava com risadas contidas e sussurros nervosos.
Atravessei o salão, todos os olhares se voltaram para mim. Havia respeito, mas também uma tensão quase palpável. Sabiam que eu não era um visitante comum.
O gerente, um homem gordo de olhos pequenos e sorriso cínico, surgiu de trás do balcão.
— Sebastian — disse ele com voz arrastada, cada palavra medida. — O futuro dono da corporação finalmente honra este lugar com sua presença. Que honra para nós.
— Não vim para elogios — respondi, firme. — Quero falar sobre o atraso dos pagamentos. Isso está afetando mais do que seus cofres, está afetando a confiança.
Ele esfregou as mãos, calculando o próximo movimento.
— Você sabe como é, problemas acontecem. As coisas não andam sempre como planejado.
— Não me interessa o motivo, só quero a solução — olhei direto nos olhos dele, deixando claro que não toleraria desculpas. — Quero que o fornecedor responsável apareça aqui em uma hora. Caso contrário, as consequências serão... desagradáveis.
O gerente riu, mas havia nervosismo na risada.
— Você sempre tão direto, Sebastian. Admiro isso.
Então, da porta dos fundos, entrou um homem alto, expressão dura. O fornecedor, provavelmente. A atmosfera ficou mais tensa, todos aguardavam o confronto.
Enquanto eu falava com ele, um dos meus homens puxou discretamente outro para um canto escuro e, com calma, apontou uma arma para o peito daquele que ameaçava nossos negócios. O silêncio caiu pesado na sala.
De repente, vários homens sacaram armas, apontando para mim. Um jogo perigoso começava. Sorri, sem mostrar medo.
— Parece que a festa começou. — Minha voz firme, o olhar desafiador.
O fornecedor levantou a mão, ordenando que todos baixassem as armas.
— Calma, calma — disse ele. — Que todos baixem as armas.
Os homens recuaram, mas o aviso havia sido dado.
Sorri novamente, sabendo que nada sairia barato.
— Isso não ficará barato — avisei.
O acordo ficou selado no silêncio denso da sala.
Saí do bordel com a certeza de que, na guerra que travava, poder não era apenas dinheiro — era controle, respeito e medo.