Capítulo 8 – Rainha do Trono Dele.

957 Words
Fazia uma semana que Gabriel estava se recuperando. Mesmo com os pontos, ele insistia em levantar, caminhar e organizar as coisas da “firma” dele — como ele mesmo dizia. Mas eu via nos olhos dele: ainda doía. E mesmo assim, ele não recuava. — Quem manda não pode mostrar fraqueza. — ele me disse uma noite, deitado no sofá, com uma bolsa de gelo no ombro. — Mas eu tô aqui, Gabriel. Você pode baixar a guarda comigo. Ele olhou fundo nos meus olhos. Me puxou devagar, me sentou no colo dele e segurou meu rosto. — É isso que me assusta. Com você, eu esqueço que preciso ser forte. — Então esquece. Só por uma noite. — sussurrei. --- Naquela noite, fiz um jantar simples: arroz, feijão, carne frita e um suco de laranja. Ele comeu calado. Mas o jeito que me olhava… como se cada garfada fosse um voto silencioso de paz. — Você cozinha bem. — ele disse, sorrindo de lado. — Minha mãe me ensinou. Quando ainda dava tempo. — Ela sabe que você tá aqui? — Não. Ela pensa que eu tô na casa de uma amiga. Ele franziu a testa. — Isso pode dar merda. — Eu vou contar. Só tô esperando o momento certo. — Você não me esconde de ninguém. Eu não sou segredo. — Você é meu segredo mais perigoso. — respondi. Ele sorriu. E nesse sorriso tinha algo novo. Algo que me prendeu por dentro. --- Depois do jantar, ele me chamou pra subir. O quarto dele era escuro, com uma luz azul fraca iluminando uma parede cheia de armas e relógios. Mas o que me chamou atenção foi a cama. Grande. Bem arrumada. E cheia de espaço pra mim. — Agora você mora aqui. — ele disse. — Você decidiu isso por mim? — Não. Eu tô só colocando o que você já aceitou em palavras. — E se eu quiser ir embora amanhã? — Eu deixo. Mas vou atrás. — Isso é obsessão. — Não. Isso é amor do meu jeito. --- Deitei na cama. Ele deitou do lado. Ficamos em silêncio por alguns minutos. Até que ele virou o rosto pra mim. — Eu quero te mostrar algo. — O quê? Ele se levantou, foi até uma caixa no canto do quarto e voltou com um colar. Fino, de prata, com um pingente de fuzil pequeno e brilhante. — O que é isso? — Um presente. — Isso é uma arma. — É o símbolo da minha vida. E agora… você é parte dela. Fiquei em silêncio. Ele colocou o colar em mim, com cuidado. O frio do metal bateu na minha pele, me fazendo arrepiar. — Agora todo mundo vai saber que você é minha rainha. — ele disse. — E rainha de morro tem que ser respeitada. — E se eu não quiser esse trono? Ele deu um sorriso torto. — Então eu destruo o morro e construo outro só pra você. --- Na manhã seguinte, a realidade bateu. Enquanto ele tomava banho, meu celular vibrou. > Mãe: “Cadê você? Tô te procurando há 3 dias. Me responde, pelo amor de Deus.” Senti o coração apertar. Era fácil esquecer o mundo ali com Gabriel. Difícil era encarar as consequências. Respondi rápido: > “Tô bem. Depois te explico. Te amo.” Guardei o celular antes que ele visse. Mas já era tarde. — Quem era? — ele perguntou, surgindo na porta só de toalha, molhado, com aquele corpo que fazia até minha alma tremer. — Minha mãe. — Você tem que contar logo. — Eu sei. Só que ela vai surtar, Gabriel. Você sabe o que as pessoas pensam de você. Ele se aproximou devagar. — Eu não quero ser o vilão da sua história. Mas se for pra ser… que seja com você do meu lado. — Você não é vilão. — Sou, sim. Mas pra você, quero ser o capítulo mais bonito. E me beijou. Devagar. Intenso. Como se selasse uma promessa. --- Horas depois, estávamos no alto da laje. Ele encostado no parapeito, olhando o morro como quem domina tudo. Eu sentada num banco, vendo ele de perfil. — Você tem medo de morrer? — perguntei de repente. Ele virou o rosto, sério. — Já tive. Hoje, tenho medo de te perder. — Eu tenho medo de te ver caindo. Eu não quero enterrar ninguém. — Então ora por mim. — ele disse, e abaixou o olhar. — Mesmo que Deus não me escute mais. — Ele escuta. Eu vou fazer Ele escutar. Ficamos em silêncio. O vento batia forte. O céu estava limpo. Mas no morro, sempre havia nuvem carregada no horizonte. --- De repente, o telefone dele tocou. Ele atendeu, ouviu e desligou. Virou pra mim, sério. — Desce agora. Fica dentro de casa. — O que foi? — Chegaram caras armados no beco da Laje Quente. Estão perguntando por mim. — Você vai? — Eu tenho que ir. — Não vai. Você ainda tá se recuperando! — Eu não posso fugir. Se eu fujo uma vez… perco tudo. Ele pegou a pistola de cima da mesa. — Gabriel, por favor… — Se eu não voltar em meia hora, você liga pro Nando. Ele te tira daqui. — Não faz isso. Ele me abraçou. Forte. Quente. Demorado. — Você é a única coisa que me faz querer sair vivo disso tudo. E saiu. --- E eu fiquei ali. Sozinha. Com o cheiro dele no travesseiro. Com o coração dele nas mãos. E com o medo me consumindo por dentro. Porque agora eu não era mais só a garota comum. Agora eu era a rainha do trono dele. E nesse mundo… rainhas também sangram.
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