César olhava, impressionado, a forma como a mulher à sua frente trocava o pneu da sua caminhonete. Ela era pequena, mas ágil no que fazia.
— Onde aprendeu a trocar um pneu? — perguntou ele, enquanto ela removia o que estava furado e retirava o estepe.
— Já faz um tempo. Tinha um carro velho que sempre me dava trabalho, então trocar o pneu foi o de menos. — disse ela, e César riu da resposta.
— Isso me lembra do meu fusca. — respondeu ele.
Cara levantou a cabeça rapidamente, com os olhos brilhando. Ela amava o fusca, mas infelizmente nunca pôde adquirir um. Até porque o valor para restaurar um carro daqueles custava um absurdo.
— O senhor tem um fusca? — perguntou ela, animada.
— Sim. Quando o comprei, ele me dava muito trabalho, mas depois consegui um dinheiro e mandei restaurá-lo. Agora ele é meu carro favorito e não me dá mais problemas. — respondeu ele, lembrando-se do seu começo nos negócios.
— Deve ter muitas memórias agradáveis. — disse ela, enquanto encaixava o estepe no lugar e começava a apertar os parafusos.
— Sim, muitas. — respondeu ele.
César observava, atento, o cuidado de Cara ao trocar o seu pneu. Ela era uma mulher bonita e talentosa ao que parecia, mas o que mais chamava a sua atenção era a forma como ela conversava com ele. Era algo tão tranquilo e natural que ele se surpreendia. César sentia falta daquilo: na maioria das vezes, as pessoas apenas se aproximavam dele por interesse, mas ali estava ela, alguém que não fazia ideia de quem ele era e que conversava de forma espontânea.
— Quantos anos você tem, Cara? — perguntou ele, curioso.
— Tenho trinta e dois, mas o espírito é de uma velha de setenta. — disse ela, rindo de sua própria piada r**m.
— Você ainda é jovem. Não pode ser tão m*l-humorada quanto uma senhora idosa. — disse ele.
— Não é o que meu filho fala às vezes. — respondeu ela, rindo.
César se surpreendeu com a resposta. Olhando para seu rosto, não imaginava que ela já tivesse filhos.
— Você é casada? — perguntou ele.
Cara ergueu o rosto e encarou os olhos castanhos de César, tentando entender o que ele queria com aquelas perguntas.
— Me desculpe se fui indelicado, mas você me parece tão jovem. — explicou ele.
— Eu sou divorciada e tenho um filho de seis anos. — respondeu ela. Mas César percebeu que os seus olhos não tinham mais aquele brilho divertido de antes. Parecia ter tocado em algo doloroso para ela.
— Me desculpe, fui indelicado com a minha pergunta. — disse ele, pesaroso.
— Está tudo bem, é só... complicado. — respondeu ela, por fim, terminando de trocar o pneu. Cara pegou o pneu furado com dificuldade e colocou na carroceria da caminhonete. — Prontinho, você já está liberado.
César riu com as palavras dela. Jamais tinha encontrado alguém tão animada quanto a mulher à sua frente.
— Obrigado por sua ajuda, querida. — disse ele, pegando a carteira e retirando um bolo de notas de dentro, estendendo-o a ela. — Um agrado pela sua ajuda.
— Não vou aceitar, senhor César. Faria isso por qualquer um que precisasse. — disse ela, recusando.
— Mas eu tomei muito do seu tempo, e ainda estraguei a sua roupa. — disse ele, apontando as manchas de graxa que o pneu tinha deixado na blusa dela.
— Vamos fazer assim: na próxima vez que nos vermos, o senhor me paga um café. — disse ela, sorrindo.
— Me chame apenas de César, querida. E se isso vai te fazer sentir melhor, então temos um acordo. — disse ele, estendendo a mão boa e apertando a dela.
— Estamos combinados, César. Foi um prazer conhecê-lo. — disse ela, pegando a bicicleta e saindo.
César observava Cara partir com um sorriso no rosto. No fundo, parecia que tinha valido a pena deslocar o braço na fazenda; caso contrário, não teria conhecido aquela mulher. A sua mente viajou até seu filho, pensando no que ele diria se soubesse o que acontecera.
Cara correu para casa. Assim que chegou, tomou um banho e começou a preparar o almoço. Precisava ser rápida ou se atrasaria, e ela não queria que Lúcia perdesse o horário de almoço.
Algumas horas depois, Cara montava a mesa para o almoço — algo simples: arroz, feijão e bife acebolado. Não demorou muito e Lúcia chegou daquele jeito de sempre, jogando as sandálias pelo chão e se jogando no sofá com um suspiro.
— Não seja bagunceira. — disse Cara, colocando as sandálias dela em um canto.
— Desculpa, Cara, mas minha manhã foi terrível. Achei que trabalharia menos vindo para cá, mas estava bem enganada. — respondeu ela, fazendo uma careta.
— Ao menos você tem um bom trabalho. — disse Cara, suspirando, enquanto se sentava ao lado de Lúcia.
— Não fique assim, Cara. Estou tentando ver se consigo uma vaga para você lá, mas eles querem alguém com experiência. — disse ela, com olhos tristes.
— É melhor assim. Se trabalhássemos juntas, o nosso serviço não renderia. — disse Cara, rindo.
Lúcia riu com ela, mas podia ver o quanto a amiga estava triste com aquela situação.
— Tudo vai se ajeitar, Cara. Você vai ver. — disse ela, segurando as suas mãos.
— Eu só queria que fosse logo. Não quero te dar mais trabalho.
— E quem disse que você me dá trabalho? Eu estaria muito solitária sem você e o Gael por perto. — disse, levantando-se e pegando um copo de água na geladeira.
— Eu queria ao menos te ajudar um pouco. — insistiu Cara.
— E você me ajuda, e muito. As minhas roupas e essa casa não se limpam sozinhas. É você que mantém tudo organizado, e sou muito grata por isso. Então, esqueça essa ideia de que não me ajuda. — disse, sentando-se à mesa para almoçar.
— Ainda vou te recompensar por tudo o que está fazendo. — disse ela, sentando-se de frente para Lúcia.
— Você já faz isso, querida, e muito bem. Agora coma e descanse um pouco. Mais tarde o nosso furacão estará aqui. — disse ela, rindo ao se referir a Gael, que estava na escola.
Cara sabia que tinha dias difíceis, mas era grata por ter Lúcia em sua vida. Ela era o apoio que tanto precisava para seguir em frente.